• Autor: David Coelho Mendes – Advogado

  • Publicado por: Diário de Coimbra

  • Data: 12 de Fevereiro de 2021

Na sequência de um esclarecimento prestado pelo Governo, no final da semana passada, (re)colocou-se a questão de saber quem deve custear as despesas dos trabalhadores em regime de teletrabalho.

Segundo o Ministério do Trabalho e da Segurança Social, devem ser os empregadores a suportar os custos do teletrabalho, especialmente no que às despesas associadas a computadores, internet e comunicações telefónicas diz respeito. A Tutela invocou, como argumento a favor deste entendimento, a norma do Código do Trabalho segundo a qual os instrumentos de trabalho pertencem ao empregador, salvo acordo expresso das partes em contrário, razão pela qual as despesas associadas àqueles instrumentos estariam, também, a cargo daquele e não do trabalhador.

Ora, desde logo é legítimo que se questione se não poderemos estar, neste contexto, perante duas situações potencialmente distintas: uma, relativa aos trabalhadores que já estavam e continuam em teletrabalho, antes da imposição legal do mesmo e por acordo com o empregador; outra, relativa àqueles trabalhadores que só transitaram para o regime de trabalho remoto devido à obrigatoriedade do teletrabalho.

Se admitirmos que estas duas situações merecem tratamentos diferenciados, dir-se-ia que os casos inseridos na primeira não são abrangidos pelo teor do esclarecimento do Governo – admitindo-se a existência de um acordo prévio das partes quanto à titularidade dos instrumentos de trabalho a serem utilizados em regime de teletrabalho, poder-se-ia defender a continuidade da regulação da situação em causa por esse mesmo acordo.

E quanto aos trabalhadores que transitaram para o regime do trabalho remoto, por imposição legal, assim como quanto àqueles que não dispõem de um acordo com o seu empregador sobre a matéria em causa?

Segundo as normas que regulam o estado de emergência, “O empregador deve disponibilizar os equipamentos de trabalho e de comunicação necessários à prestação de trabalho em regime de teletrabalho”. Significa isto que, naquele último grupo de casos, é ao empregador que cumpre suportar as despesas envolvidas com computadores, internet e telefone?

Supondo que a resposta deve ser afirmativa, coloca-se, ainda assim, um problema adicional – o que sucede nos casos em que os trabalhadores já dispõem daqueles meios? Perante um trabalhador que disponha de computador, de um pacote de internet e telefone, como devem tais despesas ser custeadas?

Uma solução, quiçá precipitada, pugnaria pela defesa da posição segundo a qual mesmo nesses casos deveria ser o empregador a suportar essas despesas – assim custeando a amortização do computador, o pacote de internet e o de telefone, mesmo sabendo que, as mais das vezes, estaríamos perante pacotes integrados.

Com a devida ponderação, a solução não parece justa. Seria mais adequado que o empregador suportasse tão-só os custos  em que o trabalhador incorresse por causa, e só por causa, do trabalho que deve prestar.

Porém, mesmo assim, as complicações não acabam. Se se pode afigurar fácil rastrear as situações em que o telefone foi utilizado pelo trabalhador ao serviço do empregador, o mesmo não se poderá dizer da quantificação dos dados de internet aplicados ao trabalho e à vida pessoal do trabalhador, e igual dificuldade se revela quanto à apreciação dos “gastos” sofridos pelo computador.

Assim sendo, a necessidade que se revela é a de uma regulamentação precisa e cuidada da questão tratada, que garanta a necessária segurança jurídica quer dos empregadores, quer dos trabalhadores.

David Coelho Mendes, Advogado, Manuel Rebanda & Associados*

*Com a colaboração do Dr. João Roque Branco, Advogado-Estagiário

*A imagem de destaque utilizada foi retirada do Google.